17.12.11

Maria do Banco

Texto e Fotos de Emerson Nogueira - Mercinho




Outro dia surgiu uma informação. Denise disse: “Merço tu sabia que Dona Maria do Banco é tia de Gloria Maria?”. Franzi a testa e disse: “quem?” Respondeu: “Gloria Maria a jornalista da Globo”. Sacudi a cabeça e perguntei: “Quem te falou”. “Foi alguém que falou na farmácia ai ela teve lá eu perguntei, ela me disse que é verdade”. No momento não me empolguei muito mais guardei no meu “HD” a informação. Os dias passaram e algo me incomodava. A historia merecia um interesse maior. 

Logo que comecei a estudar o caso fiquei empolgado. Seria bom, não só porque havia uma informação importante a ser averiguada, mas também porque muitas vezes esquecemos as pessoas do nosso cotidiano, principalmente quando são as mais simples. 

Em um domingo à noite, matava o tempo na Praça do Coreto acompanhado de meu filho Cauã. Quando se aproximou das 20:00h, desci a Pedro de Lima, para ir ao encontro de Denise, pois o expediente de seu trabalho se encerrava. Próximo ao local da minha antiga residência, algumas pessoas saiam de uma Igreja Evangélica e entre elas Dona Maria. Adiantei os passos até que lhe dei um “boa noite”. Sem perder tempo puxei o assunto e a mesma sorrindo me disse: “é verdade ela é filha do meu irmão”. 

Continuamos e ao cruzar a esquina do antigo Cinema avistei Ró conversando na porta com alguém, deu vontade de passar logo a informação, mas o horário estava estourado. A breve conversa não pode prosseguir e ficou para depois. 

Os dias foram passando e os atributos do dia a dia não me deixavam. Ate que em 13 de dezembro de 2011, fui à pensão de Dona Maria. Fui muito bem recebido, a mesma pediu-me para aguardar um pouco, pois estava fazendo algumas cocadas. Sentei e observei a casa extensa com muitos quartos. Logo a velha aproximou-se e sentou. Começaria ali uma gostosa prosa. Dona Maria aparentava-se disposta, lúcida, alegre. Comecei com algumas brincadeiras, havia sentido um clima propicio a sorrir. Quando dona Maria foi aos poucos revivendo o passado. 

Nasceu em Olhos D’água município de Aramari, em 05 de maio de 1933. Antes disso a família vivia em Água Fria, quando houve a grande seca de 1932 (seca que ate hoje é lembrada como uma das piores em nossa região). Seu pai chamava-se Florêncio Bispo dos Santos, filho de Zidorio Luciano dos Santos, “Zidoro do Boi”, e Maria Cula de Jesus. A descendência paterna era de raízes negras, oriundas da região conhecida como Curral de Fora na fazenda Roça Grande, localidade próxima de onde passava o Rio Inhambupe. Lembra que ficava próximo da Fazenda de Agenor Moraes.  Já sua mãe chamava-se Juliana Batista de Matos, era filha de Faustino Matos, segundo Dona Maria ele era índio. Sua avó chamava-se Naninha Damasceno, era descendentes de escravos, eram da região de Olhos d’água em Aramari. 

Após o período de seca a família voltou a morar em Água Fria. Dona Maria teve muitos irmãos entre eles: Hilda, Galdensio, Marinho, Ceçe, Ranunfo, Arcenio, Beijamim, Pedro, Zé Claudio, este chamado de “Zuza”.  

Lembra da infância na roça, pescava bastante. Algumas vezes passava na correnteza do Rio com feixe de lenha na cabeça. Lembra quando criança quando seu avô Zidoro Boi chegava com seu lindo cavalo chamado “Furta Menina” e gritava de longe: “Cula, boa noite de frança que paz é dia”. Com carinho lembra-se dos domingos em que seu pai e seu tio Gregório iam sambar e tocar sanfona. A menina ficava doida pra ir mais seu pai não permitia. 

Na época teve seu primeiro namorado, mas seu pai não queria. Chamava Domingos, quando o rapaz passava para o samba seu pai dizia: “Pé do Cão passou aqui, você não vai”. 

Aos 20 anos Dona Maria ganhou rumo, foi convidada a trabalhar em Água Fria em uma casa próxima a histórica Igreja de São Sebastião. Foi trabalhar para a família de Pedro Ribeiro. Fazia trabalhos domésticos, como lavar roupa, limpar casa, e assim ficou algum tempo. Aprendeu ainda alguns ensinamentos com Dona Julieta filha de Pedro Ribeiro. Neste instante Dona Maria me disse: “Meu filho sem saber lê, eu já era uma cobra se soubesse virava uma Cainana” (risos).



Lembranças de Maria (ao centro). 
Nesta foto junto com ela, entre outros, 
Geneci, Romário, Xisto, Angélica, 
Sebastião, Roque Inspetor, Gracinha e 
Nilton Junior (neto de Maria do Banco)


Passou-se algum tempo ate vim morar em Irará. Lembra que sua primeira casa foi próxima ao atual fórum e que era tudo mato. Sofreu, a vida era difícil. O pouco que ganhava mal dava pra se manter. No balanço da conversa dona Maria se emocionou, foi quando lembrou que aos sábados uma senhora chamada Lauzinha filha de Zé Bevenuto, passava com sexto de bananas para vender na feira e ficava sempre a observar seu sofrimento. Foi quando a mesma convidou Dona Maria a morar com ela. Assim foi ganhando conhecimento e trabalhar em casa de famílias. 

Em meados da década de 50 foi trabalhar na casa do advogado Dr. Ramalho e sua esposa Dona Lalinha. Estes eram da cidade de Saúde, e estavam morando em Irará, tiveram uma farmácia. O casal tinha filhos como: Zequinha, Conchita, Daduca e João Bosco Ramalho, grande amor de Dona Maria. A velha conta que era uma negra bonita e começou um romance com João. Conta que o ponto de encontro era nos fundos da Escola Juliano Moreira. 

E assim a família foi morar em Salvador e Dona Maria foi junto, quando a família descobriu foi um alvoroço , ninguém queria por conta do preconceito. Viajou e foi morar na cidade de Saúde lá ficou algum tempo. Conta que conheceu Helio Pereira comerciante da cidade, tinha uma loja de roupa. Ele era irmão de Edgar Pereira, advogado e chegou a ser Deputado. Após algum tempo voltou a Salvador e foi morar na pensão de Dede Loura. Dona Maria conta que gostava muito de João e continuou os encontros na praia do Canta Galo e foi lá que engravidou. Dona Maria veio embora. 


Em 1958 teve seu único filho. Nasceu em Pataiba e foi batizado pelo Padre Carlos. Voltou a Irará. Morou em muitas casas ate que foi trabalhar na casa de Elísio Santana. Foram 14 anos ate que Sr. Elisio, arranjou para ela um emprego no recém chegado Banco do Brasil. Na época Dona Maria já ostentava um grande sonho, formar seu filho. Foi ai que Sr. Elísio a chamou e disse que o Banco lhe pagaria melhor e que lhe daria condições de custear os estudos de seu filho. Lá trabalhou muitos anos fazendo limpeza e servindo cafezinho, entre outras coisas. Fez muitos amigos, falou da casa da Republica, era uma alegria só. Aproveitou e mostrou-me uma fotografia de meados da década de 80.

Dona Maria conta que entre idas e vindas rodou bastante, sua vida foi um verdadeiro andarilho. Entre os lugares que morou, lembra com carinho de Cruz das Almas onde morou na casa do Dr. Lucilio Flores que era Engenheiro Agrônomo. Conta também que foi para São Paulo morar com Dom Valter e Dona Tide na Rua Baronesa de Itú, depois foram para Paranaguá. 

O bate papo tava bom, ora ou outra Dona Maria partia para a cozinha para olhar as cocadas. Eu ficava fazendo alguns rabiscos para não perder o compasso. Foi quando entrei no assunto sobre Gloria Maria.  A velha me disse que ela era filha do seu irmão Zé Claudio que se casou em Pataiba com a prima chamada Etelvina Luciana dos Santos, segundo ela mãe de Gloria Maria, Paizinho e Nêna. Segundo ela alguns dos filhos nasceram na casa de Rulfino em Inhambupe a mais de dez léguas do Curral de Fora. Informa que era região de muitas matas, passava por Maracaia e também próximo a regiões de Satiro Dias.  

A jornalista Glória Maria da Rede Globo  
foi apresentadora do Fantástico  

Perguntei se chegou a conhecer Gloria Maria, e me disse que não. Ainda me disse que após a morte de Zé Claudio “Zuza”, Nêna levou a mãe para o Rio de Janeiro. Aproveitei e questionei como sabia que a jornalista famosa era sua sobrinha. Disse-me que seus irmãos falavam. Não tinha muitas informações, só sabia que ela era casada com um estrangeiro. Disse que cada um segue seu destino e que Deus a abençoa-se. 

Já no final da prosa perguntei qual foi um momento feliz em sua vida. Disse ser a formatura de seu filho Nilton na cidade de Catú. Conta que na época Reginaldo deu dois ônibus. Dr. Deraldo levou a Banda, foi muita gente de Irará entre elas: Julieta Campos, João Lopes, Aiala Santana e Roberto, Lurdes Ferro, Beto Santana, Reginaldo, Marli, entre muitos outros. Neste momento Dona Maria voltou a se emocionar, deixei-a por alguns minutos... Em lagrimas relembrou que não foi fácil mais Deus proporcionou esta grande felicidade em sua vida. 




Maria do Banco se despede de Emerson 

Já passavam das 17:30 quando encerramos a entrevista, conduziu-me ate a porta, onde agradeci de coração, registrei a última foto e partir feliz na certeza de ter contribuído para a alegria de Maria do Banco, que teve vida difícil mais com persistência e fé conseguiu almejar seus objetivos. 

Mercinho, 15/12/11




2 comentários:

SERGIO CABELERA disse...

as tiradas de Mercinho estão cada vez mais legais. parabéns a ele, a D.Maria do Banco e ao articulador do blog.

Roberto Martins disse...

pois eh...
E eu que não entendia o pq do apelido "Maria do Banco", já que ela tinha uma pensão... Agora já sei, ela foi servente no Banco do Brasil. Daí o "sobrenome". Vlw Merço !!!